sexta-feira, 30 de abril de 2021

Serrana: utopia brasilis

Por Julio Dorneles*

Com 14 meses da chegada da Pandemia Covid-19 ao Brasil vivemos uma tragédia sem precedentes em termos de vítimas fatais. As mortes são a expressão mais devastadora. Os efeitos da Pandemia são múltiplos e conexos às perdas de vidas, causando estresses recorrentes em todo o tecido social, mas principalmente no sistema de saúde e em especial nas estruturas hospitalares. Além dos infectados pela Covid há estresse e represamento ainda não dimensionados para milhões de brasileiros que padecem de outras patologias, que tiveram tratamentos pausados ou com acesso dificultado. E, à medida que a vacina não chegava e a doença avançava, o impacto econômico no período foi igualmente devastador. Importa lembrar que o país já vinha numa recessão econômica no período que antecedeu a pandemia, esta veio a aprofundá-la. Nesse sentido, caso superado todo o atraso brasileiro nesse período em razão do negacionismo reinante, atingindo-se em algum momento a vacinação em massa, estima-se uma recuperação econômica para o ano de 2024.

É absolutamente impactante o Brasil, com uma população estimada em 214.3 milhões, ter chegado da maneira que chegamos a quase 400 mil brasileiros mortos por Covid-19 desde o registro do primeiro caso de contágio em 26 de fevereiro e do primeiro caso de brasileiro morto em março do ano passado. Não há precedentes no Brasil para tamanha tragédia sanitária. Há 103 anos houve a chamada gripe espanhola que matou 30 mil brasileiros, sendo que a população era estimada em 28,9 milhões. Esta foi igualmente em seu início relativizada em seu potencial agressivo pelo governo federal e por uma grande parte da população. Mas como admitimos uma postura negacionista tão devastadora, a ponto de um presidente da República ter publicamente e constantemente relativizado a doença e desautorizado a compra de vacinas? Isso ainda será objeto não somente de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mas de muitas teses no campo das ciências humanas.

Mas nesse Brasil há uma minúscula parte que é um verdadeiro microuniverso utópico. Trata-se da cidade de Serrana, com um pouco mais de 45 mil habitantes, localizada na Região Metropolitana de Ribeirão Preto, no Estado de São Paulo. Ali ocorreu em um período de aproximadamente três meses a vacinação para Covid-19 atingiu 60% da população. Ou seja, Serrana tornou-se um laboratório de experimentação da eficácia da CoronaVac, através de um estudo clínico dirigido pelo Instituto Butantan. Aliás, um parêntese, a CoronaVac responde por 90% da cobertura vacinal nesse momento no Brasil. Nessa Serrana brasilis veremos os resultados absolutamente positivos da vacinação em massa que, se priorizada pelo Governo Federal, poderia ser uma realidade para todo o país e não para tão somente essa pequena parcela utópica, a bem-aventurada Serrana.

 

*O autor é doutorando em Ambiente e Desenvolvimento (Univates). Mestre em Desenvolvimento Regional (Faccat), especialista em Administração Pública (EA/UFRGS), bacharel em Teologia (Faculdades EST) e licenciado em História (Unisinos).

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