quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Artigo de Opinião

Chávez, o soberano
Por Julio Dorneles*

Penso que não pode passar sem uma análise, mesmo que inicial, o processo de rompimento com os fundamentos de um Estado Democrático de Direito na Venezuela.
É de conhecimento de todos que o Coronel Hugo Chávez pretendeu chegar ao poder através de um golpe militar, em 1992, que fracassou e resultou em sua prisão temporária. O golpe fracassado, no entanto, projetou-o como uma espécie de herói popular que ousou enfrentar a opulência do Estado e o poder da elite dirigente venezuelana, e tomar as dores de mais da metade da população que vive na pobreza.
A imagem militar de Chávez é recorrente no imaginário popular latino-americano: “militares são honestos, os políticos são corruptos!” Foram líderes militares que libertaram a América Latina do domínio colonial espanhol: é verdade! Mas é uma meia-verdade, porque estes mesmos líderes eram também membros de uma elite (ricos proprietários) e, ao mesmo tempo, eram sujeitos políticos extremamente atuantes em todas as questões locais, regionais e continentais (Bolívar e San Martín).
Esse Chávez heróico, militar, revolucionário e popular o fez presidente pelo voto em eleições livres e democráticas é verdade. Mas depois da primeira eleição, Chávez aproveitou uma base de apoio majoritária no congresso e na sociedade para começar a mudar as regras do sistema que havia lhe permitido chegar à presidência da Venezuela de forma democrática. As mudanças na legislação venezuelana que a maioria chavista passou a aprovar alteraram gradativamente as regras do sistema democrático de tal forma a fortalecer a maioria e inviabilizar qualquer organização de oposição.
Em 2002, muito seguramente com o apoio da CIA (EUA), a elite venezuelana articulada a uma grande rede de comunicação, empresários do petróleo e a membros do alto comando do Exército tentaram impor um golpe de estado e aprisionaram novamente o então presidente Chávez. Ele foi libertado e retomou o controle político e militar numa ação cinematográfica da divisão de pára-quedistas. Em seguida, Chávez venceu um referendum (2004) para sua permanência no poder e obteve um terceiro mandado (2006). Na última eleição obteve 62,84 % dos votos, enquanto seu opositor obteve 36,9% (um percentual nem um pouco desprezível). Agora, em 2007, Chávez promove uma nova “Reforma Constitucional” que lhe garantirá a possibilidade de ele “querendo” e a maioria “aceitando” perpetuar-se na presidência com poderes soberanos, inclusive para intervir e nomear prefeitos e governadores.
Ora, ninguém precisa ter doutorado em ciências políticas para constatar que há um processo do que poderíamos chamar de golpe constitucional na democracia e que Hugo Chávez está mais para coronel do que para um líder democrático e socialista. A soberania na democracia chavista está no povo venezuelano em seu conjunto ou está na figura de seu “dirigente máximo”? Pode ser chamado de democrático um sistema em que aqueles que são derrotados uma eleição presidencial sejam atingidos logo em seguida com a redução ou perda de seus direitos constitucionais? Não seria próprio da democracia respeitar os direitos das minorias e das oposições?
Se não aprendermos com a história e com os erros do passado e do presente, então com que aprenderemos...

*Julio Dorneles – Professor de História e especialista em Administração Pública. www.juliodorneles.blogspot.com
- e-mail: juliodorneles@hotmail.com – fone cel. 51 8176 1970

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